ela ia ao encontro de alguma coisa que ainda não supunha certamente encontrar, ia sem pressa.
sabia de sombras, que se apressavam em se antecipar ao encontro.
o sol pesava-lhe as pálpebras e os cílios refletiam prismas na retina.
pensamentos silenciosos despertavam as ruas, as casas e os olhares por onde passava
e o tempo não lhe pesava...
andava pelas pequenas ruas relembrando contos e encantos, enquanto entre ladeiras, buscava alguma coisa rumo ao topo, no destino do horizonte.
havia uma lua fraca sob a luz do sol, costurada no azul do céu... ainda. e linda.
o chão de terra, lhe parecia crocante sob os sapatos. ouvia o silêncio tenro de seus próprios lentos passos...
a casa... a mesma casa, no mesmo cenário de tantos anos atrás... lá estava ela, a casa, talvez com as mesmas rugas que o tempo lhe entalhou o rosto, mas ainda era bela. como sabia que também era.
como se fosse a mesma menina, entrou com pouca dificuldade pela janela ainda sem tramela.
tudo estava no mesmo lugar, um tanto empoeirado de pó de estrelas que invadiam pelas frestas e havia no ar um certo peso de solidão... que também era dela, mas tudo que deixou, estava lá.
na estante, adormecidos livros que lhe ocupavam tardes na beira mar.
foi de encontro aos livros que lhes eram proibidos na juventude, que sabia estar ainda escondidos entre enciclopédias defasadas de muitos tempos atrás.
quando lentamente passou os dedos sobre a capa ressecada, sentiu que alguma coisa lhe molhava. a boca. a nuca. o sexo.
abriu a vigésima oitava página e percebeu um suspiro vindo do livro misturado com seu leve gemido e como se não fosse mais tempo de nada resistir, deixou que fosse jogada contra a estante, permitiu que o vento lhe desnudasse o véu que lhe cobria a cabeça e que os verbos lhe desfizessem o coque prateado, enquanto devorava com maturidade as palavras e versos, que agora lhe pulsavam aos olhos, latejavam o sexo e nítida e lentamente permitiu se não implorou, que lhe penetrassem o corpo e a alma.
"mil poetas e porras decantam
quando ainda o cachorro era de berço
umas moças por graça lhe pegaram
na pica já taluda, e de repente
pelas mãos lhe correu a grossa enchente..."
tinha ela 83 anos e há pelos menos 67 esperava o dia desse encontro.
de fazer amor pela primeira vez.
com versos de Bocage.
(sheyladecastilhoº
.
10 comentários:
Menina Shylinda, quase não ousei comentar, sei lá,tô receioso de ficar enfadonho, pois já me tornei seu fãzoco de carteirinha... Que dupla do barulho, essa sua tabelinha com o Bocage.
Vc é um show; um sonho; um sol... sei lá...
Beijos, tá!
Antônio José
Sheyla, não fico surpreendida com o encantamento das suas palavras, pois já conheço alguns dos seus trabalhos, me surpreendo com a forma sutil de nos transportar para um momento de magia...como uma fada/poeta...
bjks da amiga,
Crisssssss
Bocage ficou com o pau duro na tumba.
º
Ok, Paulo, sem escrotidão, sem, como se isso fosse possível.
Mas é aquilo, já devem ter falado aí em cima, eu que tenho preguiça de ler o que outros comentaristas comentam, acho inútil, mas é uma declaração de amor à literatura. Amor o caralho. Declaração de trepar com a literatuta. Pense em cada letra. A forma de cada uma. Cada coisa que dá pra fazer com elas. Afudê.
Agora é minha vez de resolver minha paudurância, Sheylinha. Ajuda ?
Beijos.
º
Paulo.
http://nabocadapele.blogspot.com
Também fico receosa de comentar e também fico com medo de ser enfadonha mas....Vou me arriscar mesmo tornando-me redundante mais e mais vezes. É que é tão lindo, Sheyla! Lindo mesmo, a maneira que escreveu, a delicadeza e urgência da primeira vez- os versos de Bocage. Cada cena eu imaginei ao tempo em que lia, o coque prateado, o chão de estrelas, o peso da solidão que também era dela... LINDO!
Um beijão Poeta
faço coro!
estou encantada, já disse!
Há encantamento mais delicioso do que a arte de fazer amor com as palavras?
que delicia, um cabacinho de Bocage? hummmm
e o chão crocante então... perfect!
slept!
um dia escrevi, amiga querida e poeta, mesmo em prosas: "não existe distância, senão simetria, entre a boceta e a borboleta, entre bocage e a poesia...". Vc me fez ver que algo me intuia uma verdade maior que a minha. Sheylloca, vc é do Castilho. Do caralho, pronto, disse
Essa moça escreve uma barbaridade. A um tempo erótica e emocionante. Parabéns, Sheyla. Passo a seguir seus escritos de forma gulosa.
... No fim são sempre eles, OS PRAZERES, que tanto nos fazem bem... Amei!
Bjokasssssss
Postar um comentário